Artigo apresentado no EnANPAD 2020 narra história de professor da UFLA e contribui para estudo da carreira docente
A história de vida de um professor pode ajudar na compreensão da profissão docente? Um artigo apresentado na última semana, no XLIV Encontro da Anpad (EnANPAD), mostra que sim. O estudo aborda a história do professor da Universidade Federal de Lavras (UFLA) Gideon Carvalho de Benedicto, aposentado em 2019 e atualmente em atividade voluntária no Programa de Pós-Graduação em Administração (PPGA).
De acordo com as autoras do artigo, a professora Cléria Donizete da Silva Lourenço e a então bolsista de iniciação científica Iasmin Ribeiro Diniz, há, hoje, nos cenários nacional e internacional, um movimento mais humanizado de pesquisa da profissão docente, em que a história oral possibilita ao professor revelar suas experiências docentes. Essas experiências, dentro de uma perspectiva educativa e de formação docente, têm o potencial, por exemplo, de despertar os jovens estudantes para as questões da carreira.
Outra reflexão importante apresentada no artigo é a de que a formação do professor vai além dos cursos formais, e se faz durante toda a sua vida, antes mesmo de ingressar na profissão. O estudo mostra, por exemplo, que as características pessoais e valores de Gideon, frutos de sua história de muitos esforços, marcam também sua postura como professor e são identificáveis nos relatos dos estudantes. Eles atribuem o bom relacionamento de Gideon com as turmas a práticas como chamar os estudantes pelo nome, contar suas histórias de superação, ter muito cuidado ao chamar a atenção do estudante, ter domínio de conteúdo e boa didática, ter bom caráter e valores sólidos,demonstrar comprometimento com a sala de aula e principalmente ter respeito absoluto por eles. São posturas que envolvem empatia, comprometimento, ética, responsabilidade.
No período de dez anos em que atou na UFLA como docente ativo no quadro (2009-2019), Gideon foi homenageado sete vezes pelas turmas que colaram grau no curso de Administração. Foi o professor mais homenageado pelas turmas, o que expressa reconhecimento por parte dos estudantes. Por isso, sua história foi eleita para subsidiar análises teóricas sobre formação e autoformação docente.
Em resumo, a história de Gideon apresentada no artigo descreve as dificuldades que enfrentou para ter acesso aos estudos, a sua persistência e esforços para superar as dificuldades e os diferentes momentos de sua trajetória como docente, seus desafios e suas posturas no exercício das atividades. Comparada à proposição teórica de que os docentes passam por diferentes fases em seu ciclo profissional, foi possível verificar que Gideon não vivenciou algumas das fases esperadas, e em outras permaneceu prolongadamente.
A metodologia utilizada no artigo foi a história oral temática, em que o professor fala aos pesquisadores sobre suas memórias, e as análises concentram-se nos aspectos que podem estar relacionados a um tema específico - neste caso, a carreira de docente. A essas informações se juntam as anotações de campo dos pesquisadores e relatos de ex-alunos. Deixando-se pesquisar, além de toda a contribuição direta que deu na formação de centenas de estudantes, o professor deixa nova contribuição a todos os estudiosos dedicados aos estudos da formação docente.
A professora Cléria diz que essa foi sua primeira experiência de utilização do método biográfico em pesquisas com docentes e ressalta que já foi possível perceber o seu potencial tanto como método de pesquisa quanto como instrumento de formação. “O professor, ao narrar as suas histórias, constrói e reconstrói sentidos da sua profissão, o que auxilia no processo de autoformação. Para mim, como pesquisadora, foi um grande desafio investigar uma profissão que também é a minha. Por outro lado, foi muito valioso, porque pude perceber, por meio das narrativas do professor Gideon, o quanto a docência pode ser uma profissão gratificante”, diz.
Confira alguns trechos do artigo e saiba mais sobre o professor Gideon
“Meu projeto de vida sempre foi ser alguém que pudesse ajudar os outros. A forma que encontrei para fazer isso, foi sendo professor”.
Gideon fala com orgulho do fato de nunca ter se desentendido com nenhum estudante durante toda a sua trajetória. Para ele, “professores e alunos não podem ser adversários, eles precisam ser aliados” porque “no novo paradigma da educação, o professor não apenas ensina, mas também aprende” fazendo dessa relação uma relação de reciprocidade.
Sua postura ética, que também é uma postura didática, também se manifesta quando Gideon deixa claro que não importa o número de estudantes que estão interessados na aula, sua conduta é sempre a mesma no sentido de fazer o seu melhor. Fazer este melhor implica, entre outras coisas, ter empatia pelos estudantes; não fazer distinção de nenhum deles; mostrar que a vida estudantil não é um caminho fácil, mas que vale a pena e, especialmente “levar o lado humano para a sala de aula”. Segundo Gideon, isso se deve ao fato de ele ter passado por muitas dificuldades no seu processo de formação e, com isso, consegue entender a posição dos estudantes. Essa atitude de Gideon é percebida por um ex-monitor da seguinte forma:
“Aprendi muito sobre contabilidade geral e gerencial ao trabalhar ao lado dele ao longo de três semestres. Entretanto ao final da experiência como monitor é que pude compreender que a grandeza de um professor não está em dominar o conteúdo que leciona, nem nas experiências no mercado que pode narrar, nem no esforço acadêmico de desenvolver os conhecimentos de uma área, nem em conhecer sobre docência e didática. Aprendi com o Gideon que para ser um grande professor, antes de tudo, é preciso ser um grande ser humano”.