Mais de 470 servidores que contribuíram para a evolução da ESAL/UFLA alcançaram a aposentadoria até o momento
A Universidade Federal de Lavras (UFLA) tem hoje em seus registros mais de 470 servidores aposentados. No último ano, de setembro de 2019 a agosto de 2020, foram 19 novas aposentadorias. Todos os anos, por ocasião da Semana de Ciência, Cultura e Arte, durante a qual se comemora o aniversário da Instituição, é realizado um evento especial para esse público, que por anos deu sua contribuição para que a Universidade se tornasse o que ela representa hoje para a sociedade brasileira.
Nas comemorações pelos 112 anos, a homenagem exigiu adequações, já que os encontros presenciais não são recomendados, em razão da pandemia de Covid-19. Mas esse público não deixa de ser lembrado com o respeito e o reconhecimento a que faz jus. A semana de 20 a 26 é dedicada a postagens relacionadas aos aposentados, com mensagens enviadas por eles.
A aposentaria é um direito social e corresponde a um estágio específico da vida do trabalhador. Não é uma etapa simples da vida, porque a pessoa precisa reorganizar-se e lidar com novas aprendizagens. E cada cidadão vivencia de forma diferente esse momento: há quem o deseje muito; há quem tenha certo temor de encarar a nova rotina; há quem se adapte muito bem aos dias longe do mercado de trabalho; há que enfrente dificuldades emocionais mais sérias. Há também quem escolha permanecer no mercado de trabalho na mesma atividade, ou quem permanece no mercado, mas se dedica a outras áreas de atuação. O fato é que a aposentaria está relacionada a uma etapa da vida que ainda é um desafio para muitos - o envelhecimento. Envelhecer pode trazer angústia, mas também boas sensações.
Clique e saiba como alguns aposentados da UFLA avaliam a vida pós-aposentadoria
Na UFLA, há uma boa notícia também para quem está prestes a se aposentar. A Pró-Reitoria de Gestão e Desenvolvimento de Pessoas (PRGDP) vai passar a ofertar um curso de Preparação para a Aposentadoria. O objetivo é justamente fornecer subsídios legais/ previdenciários e psicossociais, com o intuito de preparar os servidores para a transição existente entre a carreira pública laboral e o período pós aposentadoria. Em breve, informações mais detalhadas sobre a iniciativa serão divulgadas.
O Portal UFLA conversou com a professora do Departamento de Administração e Economia (DAE) Mônica Capelle, que estuda relações de trabalho, carreira e outros temas relacionados, que podem ajudar os profissionais a refletir, à luz da ciência, um pouco mais sobre a aposentadoria no contexto da vida profissional.
Entrevista
Portal UFLA . Qual é a importância de preparação para esse momento da aposentadoria? Como a UFLA e outras instituições/empresas podem ajudar esse profissional?
Mônica . O trabalho formal, na nossa sociedade, assumiu um papel muito central na vida das pessoas, sendo um fator de identificação para o indivíduo que determina o valor social de cada um. Muitas pessoas constroem significados para suas vidas por meio do trabalho e, quando param de trabalhar, podem perder essas referências e se sentir improdutivas e incapazes. Essa perda de referências pode comprometer a qualidade de vida do indivíduo e o seu processo de envelhecimento por lhe faltarem condições de priorizar outros valores e atividades em suas vidas.
Por esses motivos, é muito importante que as pessoas se preparem para o momento de aposentadoria. Na verdade, a aposentadoria já deve ser planejada desde quando se começa a trabalhar, por exemplo, estipulando-se a idade aproximada em que se espera aposentar, o padrão de vida que se pretende manter, entre outras coisas. Obviamente, é muito difícil planejar tão precisamente uma aposentadoria que é tão distante quando se começa a trabalhar, o que faz esse planejamento parecer desnecessário. Entretanto, à medida que os anos vão passando e a idade delineada para a aposentadoria vai se aproximando, a questão começa a incomodar e a ser mais constante nas preocupações do indivíduo. Quanto mais preparação para este momento houver, menores serão as preocupações, inseguranças, traumas e incertezas.
As organizações e instituições podem ajudar seus colaboradores nesse planejamento de suas carreiras desde o início. Mais especificamente na etapa da aposentadoria, há vários tipos de programas de preparação para a aposentadoria que podem ser oferecidos. Esses programas normalmente abordam questões, tais como o autoconhecimento, o planejamento de projetos de vida, a administração financeira, a gestão do tempo livre, saúde e lazer, entre outras questões, com o propósito de resgatar a autoestima por todas as realizações já conquistadas no passado e de prevenir possíveis problemas advindos da aposentadoria. Com isso, a organização pode ajudar reduzindo ansiedades e dúvidas comuns nessa fase da vida e facilitando o desenvolvimento de novos projetos, interesses e motivações.
No caso específico da UFLA, pode-se pensar também no esclarecimento sobre a legislação vigente e no suporte para novos cálculos diante das mudanças nas regras de aposentadoria do setor público para facilitar o planejamento futuro.
Portal UFLA . Como você avalia ser hoje o suporte oferecido pelos empregadores no Brasil para que seus funcionários/servidores tenham na aposentadoria uma experiência positiva?
Mônica . Os programas para a aposentadoria, de acordo com Pazzin e Marin (2016), começaram a ser desenvolvidos na década de 1950, nos Estados Unidos, e no final dos anos 1980, no Brasil. Inicialmente, eles visavam apenas a informar. Mais tarde, começaram a pensar também na saúde e bem-estar dos aposentados, em seus projetos de vida, interesses e atitudes pessoais e familiares. Portanto, já há bastante tempo são apresentados como políticas de gestão de pessoas relevantes nas organizações. Além disso, também possuem amparo legal, pois, de acordo com o site Desaposentado.com.br (2020), no Brasil, os Programas de Preparação para a Aposentadoria encontram base legal nas Leis nº 8.842/94 (Política Nacional do Idoso) e nº. 10.741/03 (Estatuto do Idoso), ambas destinadas ao apoio e amparo às pessoas idosas.
Contudo, infelizmente, não é a maioria dos empregadores que oferece programas de preparação para a aposentadoria. Encontramos no mercado algumas empresas que oferecem esse tipo de consultoria para a preparação para a aposentadoria, e são eventualmente contratadas para isso. Porém, institucionalmente falando, ainda não é uma política prioritária de muitas organizações. Pazzin e Marin (2016) afirmam que somente 23% das organizações brasileiras oferecem programas para a aposentadoria como parte de suas ações para a promoção de saúde do trabalhador.
Portal UFLA . Como você percebe que o mercado de trabalho lida com o envelhecimento de seus profissionais?
Mônica . Sobre o envelhecimento dos trabalhadores, trata-se de um dos fenômenos mais significativos do século XXI, com tendência crescente, visto que a cada dia as pessoas se aposentam com idade mais avançada. Diante da forte presença de jovens no mercado de trabalho, atualmente, os profissionais com mais de 50 anos, segundo Cepellos (2013), são considerados profissionais mais velhos nas empresas em geral, o que tem despertado a discussão sobre o preconceito de idade, também conhecido como “ageismo”, e sobre as práticas de gestão de idade que deveriam ser mais frequentemente adotadas pelas empresas, porém não o são.
De acordo com Cepellos (2013), embora a idade seja um tema pouco abordado, ela está associada às expectativas de trabalho dos profissionais e pode ser considerada um fator identitário dos indivíduos, resultando, inclusive, na criação de estereótipos e em sua exclusão no (e do) local de trabalho. Entre esses estereótipos, estão dizer que os trabalhadores mais velhos têm dificuldade de aprendizagem, principalmente de novas tecnologias, que são lentos e que possuem flexibilidade limitada, por exemplo.
As práticas de gestão da idade no local de trabalho devem combater as barreiras etárias e promover a diversidade de idade nas organizações. Os programas de preparação para a aposentadoria estão entre essas práticas, juntamente com os treinamentos adequados, a valorização da experiência, a preocupação com a ergonomia e saúde e o combate aos estereótipos.
Portal UFLA . Você diria que a etapa da aposentadoria pode ser um momento de desenvolvimento, e não apenas de adaptação a uma nova realidade?
Mônica . Eu realmente acredito que a aposentadoria deve ser vista como uma nova etapa na vida das pessoas, e não como um término da contribuição do indivíduo à sociedade. Isso porque, embora a estrutura formal das organizações faça parte do contexto de carreira de muitos indivíduos, ela não é só isso. No Núcleo de Pesquisas em Organizações, Gestão e Sociedade (Neorgs), desenvolvemos pesquisas sobre diversos tipos de trabalho e carreiras, cujo tempo para a aposentadoria não coincide, necessariamente, com a idade mais madura. Por exemplo, em um de nossos últimos projetos, pesquisamos a carreira de ex-atletas de alto rendimento, profissionais esses cujo tempo de competição de alto nível corresponde à faixa etária entre dezesseis a trinta e poucos anos. Como encarar uma aposentadoria nessa idade? A carreira não termina ali, ela se transforma, segue outros rumos.
Portal UFLA . Hoje, na UFLA, temos 15 servidores que já se aposentaram e atuam como docentes voluntários. O que é necessário para que essa prática seja positiva para a Instituição e para eles mesmos?
Mônica . O trabalho voluntário é uma das maneiras que a pessoa pode encontrar para preencher o tempo livre advindo com a aposentadoria e buscar sentido e realização para a sua vida, além de contribuir com a sociedade. Muitas pessoas encontram no voluntariado maneiras de sentirem-se importantes e queridas. Para Lopes (2006), a atividade voluntária formal entre pessoas que já se aposentaram por tempo de serviço estimula o processo de socialização e o autoconhecimento e aumenta a satisfação e os afetos positivos. Entretanto, como qualquer forma de trabalho, o trabalho voluntário requer comprometimento do voluntário, compromisso e cumprimento de atribuições. Além disso, deve estar devidamente regulamentado, ser instruído e supervisionado e as instituições que o utilizam devem garantir a segurança e a integridade das pessoas que o praticam.
Portal UFLA . Há alguma recomendação/orientação que você daria aos profissionais sobre a fase da aposentadoria? (Para aqueles que estão ainda no início da carreira e para quem já chegou ao momento de aposentadoria)
Mônica . A orientação é que todos encarem a carreira como um caminho que envolve tanto a vida pessoal como a profissional, e que está sujeita a diversos desvios, mudanças e transformações. Por isso, devem sempre que possível procurar planejar antecipadamente essas transformações, inclusive a aposentadoria, e se preparar para elas. O autoconhecimento - saber do que se gosta de fazer, desenvolver hobbies, cultivar amizades - o autocuidado com a saúde física, mental e financeira e, sobretudo, a autoestima e autoconfiança são elementos importantes nesse processo. Poder contar com a organização em que se trabalha também é uma grande ajuda.
Referências citadas na entrevista:
CEPELLOS, Vanessa Martines. O envelhecimento nas Organizações: das percepções de gestores de Recursos Humanos às práticas de gestão da idade / Vanessa Martines Cepellos. - 2013. 98 f. Dissertação (mestrado) - Escola de Administração de Empresas de São Paulo.
LOPES, A. Trabalho voluntário e envelhecimento: um estudo comparativo entre idosos americanos e brasileiros. 197 págs. Campinas, São Paulo: 2006. Tese (Doutorado em Educação – Área de Concentração Educação, Sociedade e Cultura), Faculdade de Educação da UNICAMP, Campinas, 2006.
PAZZIM, Tanise Amália; MARIN, Angela. Programas de Preparação para Aposentadoria: Revisão sistemática da literatura nacional. Rev. bras. orientac. prof [online]. 2016, vol.17, n.1, pp. 91-101. ISSN 1679-3390.
SOARES, D.H.P.; LUNA, I.N.; LIMA, M.B.F. A arte de aposentar-se: programa de preparação para aposentadoria com politiciais federais. Estud. interdiscipl. envelhec., Porto Alegre, v. 15, n. 2, p. 293-313, 2010.
SOUZA, Rosangela Ferreira de; MATIAS, Hernani Aparecido and BRETAS, Ana Cristina Passarella. Reflexões sobre envelhecimento e trabalho. Ciênc. saúde coletiva [online]. 2010, vol.15, n.6, pp.2835-2843.
Colaborações nesta matéria: Melissa Villas Boas e Karoline Marques da Silva (Comunicação UFLA), Flávia Bruzzi e Eliza Saltarelli (PRGDP), Mônica Capelle (DAE) e os servidores aposentados da UFLA Eleci Pereira, Mariza Alvarenga Mesquita, Sônia Castejon Branca Alves Abrahão e Fábio Cartaxo.